TABONS, QUEM SÃO?

José Luiz P. da Costa

Jacinto Vieyra, um Tabom,do Daomé (Benim)
(Livro)

"Engenheiro agrônomo Antônio Fagundes e industrial de tijolos,
Schreiner, levam projetos a Gana,
e são recebidos em almoço por descendentes de Tabons".
Sem contar com um bairro "brasileiro", como ocorre em Lagos, na Nigéria - no Gana pode-se encontrar profundas marcas do retorno de escravos ou libertos às suas origens. Nesse país africano, especialmente nas cidades de Acra, a capital; Cape Coast e El Mina, ambas os centros mais importantes de expatriamento de escravos , coletados na chamada "Costa dos Escravos" - é fácil de encontrarem-se pessoas com nomes de origem portuguesa. Mas, sem dúvidas intrigante, é o apelido que lhes deram e que os segue já por séculos. São chamados de "Tabons". Participávamos, três brasileiros, de um churrasco na fazenda de um ganense. Nossa tarefa, naturalmente, era a de repetir o churrasco que havíamos oferecido, quando em viagem pelo Rio Grande. Seu encargo , a que se atribuiu espontaneamente, foi o de providenciar para que, também participasse do churrasco um casal de "Tabons". Quanto a nossa parte, tratamos de superar os problemas da realização do churrasco, já que o anfitrião fazia questão que inaugurássemos uma faiscante churrasqueira, adquirida em Londres. E a tecnologia crioula, aqui dos pagos, parece, não se adaptava muito ao aparato tecnológico viindo da "City". Mas em verdade, o problema maior seria transformar o carvão disponível em brasa, sem danificar a churrasqueira. Vislumbrando, entretanto, na cozinha da casa-de-campo um daqueles antigos fogareiros à brasa, optamos por fazer o fogo ali e, depois, transpô-lo para a tal churrasqueira. O engenheiro- agrônomo que integrava o grupo, tanto acostumado às pragas do soja e trigo, quanto aos problemas de campanha, conseguiu sair-se bem da empreitada, enquanto entretíamos conversação com os presente. Quanto ao casal de "Tabom" presente, nada sabiam a respeito de sua origens, senão que remotos ancestrais retornaram do Brasil, onde estiveram escravos. E, mesmo esta informação era de seu conhecimento de outiva, por intermédio de outros que, como eles, descendia de ex-escravos brasileiros ou africanos que tiveram a sorte de vir e conseguir voltar. A dúvida, pois, a respeito da origem da palavra "Tabom", ficava-nos a martelar, como um desafio a ser vencido. E, eis que num lampejo veio aquilo que, acreditamos, seja a razão de tal apelido: Os que retornaram, após os anos mais duros do tráfico, ou seja, quando dispositivos legais mais brandos tornaram as coisas mais fáceis para os "Kunta-Kinte" brasileiros, que, ao contrário do personagem de Alex Haley, puderam voltar à África - pois estes, ao embarcar num dos navios mercantes que mantinham linha comercial entre a Bahia e a Costa Oeste da África, tendo como destino a volta à Costa, retornavam com nomes e sobrenomes lusitanos e, naturalmente, falando português. Também é certo que muitos deles, senão a maioria, tornaram-se mercantes ao voltar, passando a participar das tendas dos mercados. Naturalmente, deve ter havido um período de aprendizado das línguas locais, especialmente do Gã, que é dialeto de Acra e onde os retornados se concentraram em maior número. Pois bem, no dia-a-dia do comércio, mesmo já dominando a língua local, um cacoete lingüístico não pôde ser afastado. E é exatamente aquilo que nós, comerciantes ou compradores, dizemos ao fechar qualquer operação mercantil ou, simplesmente, para caracterizar diferentes tipos de concordância:"Tá bom..." Assim, o negociante brasileiro, identiificado naturalmente como tal, assim como nas feiras locais identificamos nossos feirantes lusitanos - ao fim de cada operação, já por certo falando o idioma local, terminava a transação perguntando, num caocete subconsciente, se o preço, as medidas , a qualidade, as cores, etc. estavam bons. E daí a pegar o apelido deve ter sido mera questão de tempo. Recordo, recentemente, recebi, no Rio de Janeiro, a visita de um casal ganense, sendo ela um dos "tabons". Como qualquer turista, e mais, como qualquer mulher, em especial, também ela maravilhou-se com muitas das lojas de Copacabana e Ipanema. Levei-a às compras. E, em cada loja, enquanto eu entabolava negociações, a dama não conseguia parar de rir ao notar que, ao fim de cada oferecimento, ao fim de cada demonstração de um produto, um som, que lhe era muito familiar, aparecia: Tá bom?